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Opinião

A Reforma da Previdência é racista

Se as desigualdades entre homens e mulheres são levadas em conta quando se debate o Sistema Previdenciário, por que desconsideramos as desigualdades étnico-raciais?

A Reforma da Previdência dominou o debate político em nosso país em 2019. Criou-se expectativa de que a única saída para a crise era aprovar modificações nas regras para aposentadoria. Medidas que diminuem os valores dos benefícios e restringem o acesso para boa parte da população.

Tanto no atual modelo previdenciário quanto na proposta aprovada, compreende-se que homens e mulheres devem ter regras distintas. Resultado da reflexão feminista sobre a superexploração das mulheres, que estabeleceu que isso deve ser compensado com uma aposentadoria mais precoce e com menos tempo de contribuição.

Só que essa não deveria ser a única desigualdade levada em conta na hora de redesenhar a Previdência. Apesar do mito da democracia racial, que dá a impressão de que negros e brancos são iguais, as diferenças nas condições de vida, bens materiais, renda e acesso a serviços e direitos básicos são absurdas e obscenas.

Nós, negras e negros, somos os trabalhadores mais precarizados, maior parte da força de trabalho informal e subutilizada, os que desenvolvem mais atividades braçais e os que têm menos acesso à educação, saúde e emprego.

Somos as maiores vítimas da violência urbana, contra a mulher e do Estado. Nem a expectativa de vida é igual para negros e brancos. Estudos como o último Atlas da Violência, divulgado pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, comprovam que a “democracia racial” não existe e que nosso país ainda não superou a herança de 400 anos de escravização. Realidade que é fruto do racismo entranhado na sociedade e nas instituições.

Ignorar esse fato ao realizar mudança em uma política pública tão importante quanto a Previdência significa passar, mais uma vez, a conta para o povo negro pagar. E aprofunda o fosso de desigualdades que separam esses dois tons de pele. Mais um sinal de que ainda temos muito para avançar na questão racial no Brasil.